terça-feira, 18 de setembro de 2007

BEIJOS

Beijos são fagulha,são
Em nosso corpo
Se desbulha
No lume
De sua imensidão.
Como rio têm pulso
Impulso, afluente e foz
Têm curso e cio
E aportam em nós.
Ao beijo
Quando se mergulha
Tranca porta
Se entulha, abre comporta
Recolhe gemido e voz.
E rega paixão
Planta amores
Inventa pasmo
E cria orgasmo
E sofeja dores
Às sos.
E anestesia-nos
Como agulha
Nas beijadas
E sentimos
Seus espinhos
E espetadas...
(Do livro:"Vôo das palavras"/1998)

REBELAÇÃO DO RIO

E o rio virou serpente
Espichou-se na estrada
Fingiu-se ausente
E se negou a invernada.
Esperneou-se em gritos
Correu como puma faminto
Arrastou árvores, barreira
E não foi brincadeira
Conter seu instinto.
Amante da rosa
Amante do verde
Da noite cheirosa
E de gente com sede.
Ao rebelar ira tamanha
Lágrima, lixo e vinhotos
Inundaram-se aos esgotos
Lagos e montanha.
Ao imolar mapa e fronteira
Invadiu fábricas e cidade
Fez-se maremoto sem piedade
Aterrou casa,subiu ladeira.
Feito faca amolada
Ao meio, atravessou a esfera
Cortou ponte e calçada
Engoliu gente como a besta fera!
(Do livro:"Vôo das palavras"/1998)

ARDOR

Em mim
Há uma fogueira
De chama infinita
Que grita
Que grita teu nome
E se consome no tempo
Na distância e nem acredita
Na labareda desdita
Que grita
Que grita ardendo
No pensamento doendo
Correndo,corroendo
Correndo feito tocha
Humana
Tirana acesa
Nem livre nem presa
Que se inflama
Reclama presença
Nem olvida na fome
De corpo e vida
Perdida
Perdida que se some...
( Do livro:" Vôo das palavras"/1998)

PORTO PERDIDO

Vendo teu olhar fugidio
Adentrei-me a agonia
De aventurar-se no vazio.
Vendo-o luzir
Nem alinho nem torto
Parti na esperança
Do perdido porto...
E sem um sim
Nem um não
Mesmo assim
Trafeguei a indecisão
Dos olhos, pensando
No outro dia
Amanhecerão
Para mim..
( Do livro:"Vôo das palavras"/1998)

segunda-feira, 17 de setembro de 2007

POR DENTRO

Ninguém sabe da ânsia
Que se esconde
Entre trêmulas pernas.
Se ninguém percebe do laço
No abraço da mão
Que aperréia.
Ninguém calcula
Nem mesmo regula
Sonho que se hiberna.
Se ninguém toca no fogo
No jogo que já se incendéia.
Ninguém vê o murmúrio
Correndo nas véias
Nem o pranto
Que anda de taberna em taberna
Se do canto que se externa
Quem se atreve
Num desencanto tão breve
Fugir dessa téia?
(Do livro:"Mundos e poemas imundos"/1991)

ACIDENTADOS DO TRABALHO

Coxos, uns nos chamam
Outro, de pernetas.
E ninguém se atreve a ver-nos
Como vítimas do capital
Que gira o mundo como uma roleta
Castrando-nos o ideal como peças obsoletas.
Coxos, uns nos chamam
Outros de pernetas.
E se tornou até normal
Ninguém se atrever a ver-nos
Como vítimas do capital
Que nos decepa e esmaga
A alegria da família no planeta.
E muitos são amigos do algoz
Se mascaram com a nossa voz
Só para mamarem nas tetas.
E coxos uns nos chamam
Outros de pernetas.
Mas ninguém se atreve a ver-nos
Como vítimas do capital
Que por bem ou por mal
Gira o mundo como uma roleta....
(Do livro:"Mundos e poemas imundos"/1991)

MELINDRE

O instante requer cautela
E se o silêncio nos aniquila
Amordaça-nos agora
A vida não é apenas uam janela
Donde se olha de fora.
O instante requer cautela
E calar frente a fome
Aceitar o que nos oprime
E explora
A vida não é apenas uma janela
Donde se olha de fora.
O instante requer cautela
E viver de joelho
Dizendo-se livre numa cela
A vida não é apenas uma janela
Donde se olha de fora.
O instante requer cautela
E sem unidade, sem decisão
Tudo se esfacela
A vida não é apenas uma janela
Donde se olha de fora.
O instante requer cautela
Nos afasta, nos recolhe
Nem impede inquietude
Romper aurora
A vida não é apenas uma janela
Donde se olha de fora...
(Do livro:" mundos e poemas imundos"/1991}

SEM DESTINO

A grande máquina
Com a boca arreganhada
Tem a sanha e a gula
E exige a paga
E nos estrangula
Com juro e correção
Monetária
Se dizendo solidária
É tudo que quer
Da nossa saga...
A gande máquina
Com sua sanha
Nos abocanha
Acenando nos muros
E lodo.
De futuro difuso
Impessoais
Anônimos e frios
Tornamos parafuso
Perdemos nos invios
A noção do todo.
De quem nos usa
De quem nos controla
De quem nos manda e abusa
De quem nos elimina e esmola
E para quê.
Um prometido obscuro
E confuso.
Somos peças.
Breve estaremos
Em desuso...
( Do livro: "Mundos e poemas imundos"/1991)

quarta-feira, 12 de setembro de 2007

PICHANDO MURO

A fantasia
Encontra a realidade
Quando inunda
De poesia
O muro
E encharca de hoje
O futuro...
( Do livro: "Versos inversos"/2000)

POEMAS NOSSOS DE CADA DIA

Nunca farei poema
Para os olhos que fogem.
Farei poema
Para os que se desesperam
E se rasgam na vida.
Os que viram trincheiras
Por necessidades.
E à bordo da paixão
Constroem suas tempestades
E chamas.
Nunca farei poema
Para os que mudam sua vida
Com o contrôle remoto
E sem sair da poltrona
Interferem e ferem outras vidas
Impedindo-as a vir à tona.
Farei poema
Para os que à luz da emoção
Vivem suas realidades
Sem drama.
Porque poema
É a toda hora dilúvio
E em nós se derrama...
(Do livro: "Versos inversos"/2000)

terça-feira, 11 de setembro de 2007

MAYARA E DANDARA

Tâo rara, tão cara
E vara a madrugada!
Juizo e granizo
Nas casas de vara.
Mayara e Dandara
Tão leve, tão breve
E a neve tão clara!
Unidas na noite
E a noitada dispara
Aonde andará,andara.
Mayara ou Dandara
Encara a neve
E a neve encara!
Tão rara,tão cara
E vara a madrugada!
(Do livro:"Mãos"/2004)

DEGRADÁVEL

Sou bicho
Na lata de lixo
Deserto em mim mesmo.
Tendo endereço certo
Não vivo a esmo.
Sou pesado,buscado
Nas prateleiras do supermercado.
Nem se debata em vão
Não há opção de outra alimentação
Ou lata de lixo ou caixão.
Nem luxo nem capricho
Se sou o jogado bicho...
Mixo
Mexido sem atitude
Versado no trilho da saúde.
Sou bicho enlatado
Sou mais que guardado no luxo
saí do nicho
Pro lixo do teu bucho!
(Do livro:" Mãos"/2004)

GENOCÍDIO DE RUANDA

Pelas ruas de Ruanda
Chora a lua sem ciranda.
A miséria vive nua
O facão manda e desmanda.
Nessa artéria tão crua
O real se desanda
Sobrevive a falcatrua
Na febre de Aruanda.
Bem ou mal insinua
Só o povo desanda
Não há sol ou lua
Pelas ruas de Ruanda.
Arma de fogo,
Faca ou facão
Baioneta faz o jogo,
Atração e solução.
Vive a morte na varanda,
E o poder de mão em mão.
Na rua de Ruanda,
A vida só vive a contramão...
(Do livro:"Mãos"/2004)

A ILUSÃO EM QUATRO DIMENSÕES

Lago
Lama
Algo
Ama.
Lago
Fundo
Lodo
Afundo.
Lago
Largo
Ama
Amargo.
Assumo
Fundo
Afundo
Sumo...
(Do livro:"Mãos"/2004)

segunda-feira, 10 de setembro de 2007

ALAVANCA

A dor
não estanca.
Tem na canção
A força da alavanca.
E por mais que o desatino
Espanca
Se debela e atropela
O que banca.
A lágrima
Surta correnteza
Na estranheza
Do que tranca
Vira certeza
Raíz
Que não arranca.
A dor
Não estanca
Gera liberdade
E não retranca
Vontade
Mesmo manca
A seguir atino nas ancas
Do mundo, submundo
Que se estravanca...
(Do livro: "Greve: A voz do poema"/1987)

MUDEZ

Horizonte mudo
E vi tudo.
Na clareza do absurdo
De nunca ser mudo-surdo.
Há efusão
De tanto não.
Um silêncio sem opção.
Tristeza ou alegria em rito
Gestos de um grito
Lá longe
Mais que longe-perto.
Uma multidão
Na alusão de deserto.
Vi na dissenção
Mordaz dose
Nicho de solidão
E neurose.
Vi tudo
E o horizonte mudo...
( Do livro: "Poemas na contramão"/2006)

O DESJUNGIR

Se a água marejasse
Nos olhos dos remos
No sonho vagasse
Ferrolhos que temos...
Nem pensei acabasse
Sob inviés nos pés
Debruço virasse
Lavando a alma
Molhasse a calma
De silêncio e trauma
Envoltas marés.
A dor do tempo.
Utopia,
Reduz-se a pó.
Desvela-se lume
Desvanecendo só.
A mordaça do gume
Lugente ciume
A desdizer-se a dó.
Se a água marejasse
Dita ou desdita
Não evita no impasse
Desdar-se do nó.
( Do livro: " Poemas na contramão"/2006)

ALMA DE FORA

Corpo dança
A esperança o alcança
E aflora.
Se o mundo
O trauma
Por dentro se acalma
Toda hora.
Se nem se espanta
O tempo se balança
Na alegria que mora.
E pelo lado de fora
Canta-me a alma.
Corpo dança
Alma canta.
A vida
Na garganta
Olvida
E bate palma
Na alegria que mora.
E pelo lado de fora
Canta-me a alma...
(Do livro:" Poemas na contramão"/2006)

BRASAS

Brasas acesas
Queimam-me o sono.
E na mesa
Se derramam
Incertezas
Dando calor
Feito o dono
Do amor.
E lá fora
Só a escuridão
Aqui dentro
A solidão
A queimar-nos de frio.
Só o estalar
De brasa
No silencio a falar
E nos abrasa
Sombrio.
Lá fora
Tanto calor
Aqui dentro
Agora frio.
Livre o vento
Nas asas
Sem o desamar
Ao cós.
E só as brasas
Apagando-se
Em nós.
( Do livro: "Poemas na contramão"/2006)

sábado, 8 de setembro de 2007

CANTO DE OLHO

O poema, caminho.
A esperança, pânico.
Os passos, espinho
Abraço titânico.
Testemunha palavra
Acender lavra.
O poema trafega
Rasga em lavra, escorrega
Em nós engasga.
Esperança de vida
Argila na rijeza rebatida.
O poema esquálido
Não se entrega, nem o nega
Mesmo que o tenha
inválido...
(Do livro: "De palavra em palavra"/1987)

IMUNDÍCIE

O mundo rola
Mescla ilusão.
Abre janela
Rasga o chão.
Sem espera, arrola
Rega favelas
Coíbe flores
Fermenta omissão.
E o mundo esfola
No azedume
Escola prolifera
Indica contramão.
Mundo de todo mundo
E nem todos têm segundo
Se não de exaustão.
E a todos estirpa esperança
Mundão sem cancela
Onde tutela nem pouco alcança.
E finge auto-escola
Nos amola, depois nos atropela
E no descrédito nos lança.
Mundo,imundo,mundo
No desamor cada vez profundo.
Mundo,mundo sem dono
A lançar criança nos abandono.
( Do livro: " de palavra em palavra"/1987)

ABORTIVA

Grave
A urgência dos gestos
A se estilhaçar no silêncio
Se não criar corpo agora.
Grave
Se apenas gesto de palavra
Conduzindo ao aborto
Da aurora.
Como canção
Que não engravida
De hora em hora.
E sem lampejo
Se faz sobejo
E nem dá tempo
Para amar.
Grave
E mais grave ainda
Sem a opção
A morte do sonho
Por inanição...
(Do livro:"De palavra em palavra"/1987)

PALAVRAS TRANSEUNTES

Gasto
O gesto
Do rasto
Que indigesto
E engasto.
Detesto
Debasto
Me gasto
Me resto
Me arrasto.
Gasto
O gesto,
Arrasto
O resto,
Debasto
Detesto,
Indigesto
E me engasto...
(Do livro:" De palavra em palavra"/1987)

ASAS

Em qualquer porto, parto.
Em qualquer mar, morto.
Em qualquer quarto,
Me reparto
Ligado ou absorto.
Em qualquer caminho
Alinho ou torto.
Em qualquer canto,
Desencanto, incerto.
E por mais distante ou longe perto.
Em qualquer caminho, desalinho
Vivo ou morto.
Em qualquer deserto, extinto
Parto, perto, pinto....
(Do livro: "Cantos dos quatro cantos"/1992)

IDEOLOGIA

O cão
Em cada poste
Em cada esquina
Faz sua liberdade
Mais real
Mais consciente
Mais atrevida
Que a liberdade virtual
Burguesa
Vertida na verdade ficcional
E estranheza.
Autorizada, permitida
Asfixiada, invertida
Representada, fingida
Negada, desmerecida
Adiada, consumida...
(Do livro: " De palavra em palavra"/1987)

sexta-feira, 7 de setembro de 2007

CIDADE

A cidade
É uma úlcera aberta.
E, em nós mesmos, deserta.
À êsmo, inventa porta e janela
E na maior indecência
Fia dependência urbana e mundana
Criando no seus porões
Vielas e favelas.
A cidade
Uma imundície incurável
Flagelando sonho se alastra
E se deplora castra.
Se comunica,se explica,
Se justifica e se torna inviável.
Uma imensa ferida
Onde se cria faminto em degredo
E a vida mal ouvida
Nos seus subterrâneos e segredo.
A cidade
Planta portos e aeroportos
Enterra os vivos e cultua os mortos.
Um alucinógeno
Em que as luzes criam suas ilusões
E confundem paixões.
E,com suas fechaduras
A violência perpassa
Cessa a vontade, estrupa e aliena
À revelia de quem vê, sente e passa.
Se finge de inocente, fabricando demente
E trapassa.
Feito um bonde conduzido e conduzindo
Sem saber para onde.
A cidade
Separa as pessoas com seus arranha-céus
Individualiza a náusea aflitiva
Abominando a luta coletiva.
Inventa viadutos, tergiversa indultos
Tecendo insiltos aos urbanóides.
A cidade
Corre e pare desgosto
E no rosto desumano
Nem desiste esconder o aborto cotidiano.
A cidade
É um dilema...
Afixiado, acossado me insiro nessa gema
Com meus gemidos e poemas.
( Do livro:"De palavra em palavra"/1987)

TEIMOSIA

O sonho
Não pode acabar
Se voce não acordou
Se voce nem viver.
A noite tenta despedaçar
Os raios do olhar
Que de ninguém pode deter.
Viver o sonho é buscar
Os pedaços desse sol
Para o dia amanhecer.
Não importa o tempo que virá
Se no caminho me encontrar
A insistir
No espernear
à luta que viver...
( Do livro: "De palavra em palavra"/1987)

MIRANTE DA NOITE

Mija na noite a lua
Enquanto na rua estrelas despem
A madrugada num coito astral.
Olhos felinos inda famintos
À desatinos
Mastubam-se na canção de ninar.
Na fiesta da noite
Olhos de berro imaturo
Atordoam-se no afoite
No obscuro da alma
E o pavor de escuro
Estanca no muro a calma.
Discute-se "sexo é sexo, amor é amor"
Enquanto se decreta amar sem verbo.
As luzes não se acendem
Não miramos o fatal.
"AIDS" toma conta dos corpos
Que se divertem com o "normal".
A lua indiscreta
Ejacula concreta
Arebol.
Dos olhos do povo
Abortam o sol.
(Do livro: "Marginália viva"/1985)

PILÃO

Pilão
Que soco
Bate
Mói
Dói
E não posso negar.
Pilão
Que queima
Teima
Calefica
E fica sem se esquivar.
Pilão
Que murro
Esmurro
Esconjuro
E juro que há de cobrar.
Pilão
Sem brilho
Sem filho
Sem trilho
Que há de me levar.
Pilão
Dolente
Insistente
Inaderente
Batente que não posso faltar.
Pilão
Que engasga
Rasga abrolhos
Nos olhos para arregalar.
Pilão
Que toco
Foco
Soco
Sufoco abciso penar.
Pilão...Pilão
As tuas puas
Têm que ir às ruas
Sem se arredar.
Pilão
Que tasca
Lasca
Em vasca para arrebentar.
( Do livro: " Marginália viva"/1985)

ECOCÍDIO

A morte
Adentre mata
Desfigura floresta
Destrata.
A terra já não dá mais índio.
O fruto já não é seu fruto.
E entre todos se espalha a morte.
O pesar vira usufruto
E não há quem suporte.
Cada dia um tranco
Cada instante tomba um índio
Da morte homem-branco.
O homem mata a mata
Com suas serras e bomba
Mineradores invadem
Madereiros invadem
Grilheiros invadem
E a justiça um ardil que zomba.
Adianta mata correr
De uma dor que não estanco?
A mata também morre
Da morte homem- branco.
Do solo jorra a febre
E contamina, dos homens ,os olhos.
E se reparte, entre todos, a ambição
Sem ferrolhos
Num delito ambiental impune
O exterminio sem trégua.
A morte adentre imune
Corre légua...
A lógica anti-ecológica
Nos empreendimentos
Mineral,siderúrgico,viário, hidrelétrico
Traduzidos na morte
Munidos no suporte
Da ótica no sonho anti-ético.
Extrativismo, turismo têm mão predatória.
O homem na sua história
Tem olhar poluente.
A morte do indio, a mata doente
Jorram sangue e lágrima
Refratária.
Válvula de escape nas tensões
Na reforma agrária.
A morte
Adentre mata
Desfigura floresta
Destrata...
( Do livro:"Marginália viva"/1985)

terça-feira, 4 de setembro de 2007

OLHOS DA AMÉRICA

Olhos mil, iris esférica
Mal viu o Brasil
No sonho da América.
Mão vil, estérica
De grito sem o cio
Da América.
Água, lágrima esquálida
Fálida estratégica
Tece lástima o fio
Na noite bélica
Nos olhos mil
Do sonho da América.
Dívida,dividida dúvida, fugida
De norte a sul entérica.
Mercosul nascida, caída no meio-fio
De mágoa térmica.
E à margem do rio
Do sonho da América
De olhos mil,ìris esférica.
Se ninguém viu, nem sentiu
O Brasil sumiu do lençol do rio
No mapa que rapa
Na sanha bélica.
E quem escapa
Do sonho mil da América?
Não confio nos olhos mil
Do sol da América
Da América!...

MARIA FUMAÇA

Maria fumaça
Passa,passa
E quando passa
Deixa fumaça
No ar!...
Cigarro aceso
Vive preso na boca
Como o trem de lenha
Se desdenha translouca
No apito
E vomita quando grita
Mais lenha, mais lenha!
Maria fubica
Nos olhos de quem fica
A saudade nem se explica
Nas folhas, nas escolhas sem par.
Não se justifica
E a fumaça passa
Desenhando desgraça, implica
Pichando de escuro
No muro da cidade
E o rosto dos campos
Na morte dos pirilampos
Roubando da paisagem
A graça
De quem complica a viagem.
Maria fumaça
Feito virgem do fuligem
Nem retifica.
Faz que passa e passa
E não passa e não passa!...
( Do livro: "Doido canto douto"/2001)

CRIAÇÃO

Vivo
A busca do momento
Incisivo
De alento redivivo
Sobrevivo tento.
Na procura
Desse momento
Vivo!
E não há arquivo
No momento
Criativo
A deter esse rebento.
Tento, invento
Reinvento
Ao momento subversivo.
Crio
Porque criar
É o desafio
Ao morto-vivo...
( Do livro: "Doido canto douto"/2001)

BRILHO NO OLHAR

Onde vi o lampejo
O grito de amor
E desejo.
O vento torpo
Ficou morno
Pouco sem corpo
Jaz sem retorno.
A dignidade
Se perde em troca
Da vaidade
A inverdade campeia.
Vi
Sim, em todo olhar
Sonho tão medonho
Ingenuamentemente tateia.
Indo além,indo aquém
Sem saber quem o freia.
Onde a imensidão
Tem corpo e a alma
Sem dimensão.
E a calma da multidão
Serpenteia.
Há grito ao exautão
O medo tem devoção
A luz reluz e clareia.
( Do livro: "Fogo de palha"/1970)

MUDANÇA

A casa velha
Insiste
Ser velha.
O tempo
Insiste
Mudar
A casa
Velha.
A casa velha
Insiste
Mudar
O tempo...
Muita
Coisa
Muda
Com
O
Tempo.
Até
O
Próprio
Tempo...
( Do livro: "Fogo na palha"/1970)

SOBREVIVÊNCIA

Aos
Que vertem
Seu suor
Seu sangue
Suas lágrimas
E em lástimas
Nunca usufruem
Do que produz.
Desamarrem
Do silêncio
Os laços
Façam dos passos
Luz.
Pela liberdade
Digam verso
Gritem!, gritem!,gritem!
Rasguem o universo
Resistam a essa agonia.
Limpem o mundo
Criem a consciência
Do plantar.
É a sobrevivência
O insustentável dever
De não calar!
(Do livro:" Doido canto douto"/2001)

BARRA

A aurora
Não sabe esperar.
E se cruza na barra
E se esbarra na noite
Na sombra do amoite
Até o dia raiar.
E se posta na agonia
pinga fora à revelia
Pela sombra do dia
Se nega desvendar.
Feito peito raso
No ensejo de um vaso
Camuflando ocaso
Que nem quer vazar.
Nem sabe,
O amor vem no vento de sofejo
Se nos gabe em beijo
Põe o cio na pele e no osso
Se não vejo, senti-lo posso
Sem essa água de fosso
Sem essa mágoa de poço.
Sem acaso
Pega fogo a barra
E esparra no viver.
A aurora não sabe
Me amanhecer...

INDELÉVEL PICHE

Somos outros, somos
E quando posso, endosso
O que fomos.
Minha vida atua
No meio da rua
Correndo lado a lado da lua.
E se autua
Pela missão, pela visão.
Somos poucos
E somos multidão
E se ocaso, raso
O traço faz-me solidão.
Somos outros, somos
Como pólvora sem explosão
E quando ignoro
Mais por decoro
Do indelével foro, outra ilusão.
Somos outros,somos
E quando posso, endosso
O que fomos...

domingo, 2 de setembro de 2007

CORAÇÃO SEM COR

Pinta
Essa alma
De azeviche.
Tinta
Essa calma
De piche.
De breu brinda
E branda a noite
No acoite
Do afoite adiado.
Todo cuidado
Com o bicho solto
Um bicho no lixo
No luxo envolto.
Tudo pode pintar
Nesse olhar.
Há um sismo
Num abismo
Um cínismo
No racismo
A velar.
O branco é preto
O preto é branco
O medo, a ânsia
Não estanco....

ALQUIMISTA DO AMOR

Estrada
Do sol no sal
Química do amor
Na salina.
Lua
No farol
No luau
Quimica do amor
Na colina.
Encontro, desncontro e final
Razão, coração
Solução cumina.
Tudo trilha
No que brilha
àlibi ou armadilha
Nos ilumina.
E a sorte fica
Retifica, desatina
Quando rosna, rumina
Entre sol e sal
Química de desamor
E ruína.

FAGULHA NO ESPELHO

A chama dita
A fagulha crepita
E lá longe não apaga.
Rosna o vento
E o mundo atento
Se estraga.
A vida inserida
Enaltecida no espelho
Nulifica pentelho.
Algo que me importa
Exorta a desilusão na porta.
Sob o sol do sofá
E a solidão,...nem só nem lá.
Amar-te é guerra.
O beijo, bacamarte
De marte à terra.
A chama dita
A fagulha crepita
E ronda na serra...

ADIADO GOZO

Rumina-me o desalento
Feito canto ao vento
Desarrumando
Flôres e ornamento
Sem o credo do tempo
Marca- passo, contratempo
Destruindo monumento.
Rosna atento
Adiado gozo de seu invento.
E por cima de ideologia
Filosofia ou alento
Sobrevive a mente vã.
Agoniza sonho
Sem que mover posso
O leme, desse guardado amor
Que treme, feito fosso
A derramar-se em pranto e riso
Num perdido paraiso
Do amanhã.

EXPERIÊNCIA

Para ver se escapo com alegria
Do dia-a-dia, juntei toda economia.
Enguli sapo, joguei no lixo a poesia
Pus a mais valia como refrão.
Foi um Deus nos acuda, fingi ser ajuda
Da partifaria.
Reguei agonia, plantando ilusão.
E a noite, quando caiu, desaguando mágoa
Na escuridão, rostos dissorveram-se no medo
Achei-me só com meu brinquedo
Tragando solidão...
(Do livro: "Poemas na contramão"/2006)

REDOMA

Eu sou eu, ainda sou.
Se vim moribundo, se vi profundo
Venci, venci sonhador...
Abraçado vou ao mundo
No olhar tanseunte
Não me pergunte desse desamor.
Só o amor sobrevive, nem me prive
Mesmo vagabundo
Ainda vive num segundo
De uma flor.
E nessa redoma quando se soma
Toma hora, minuto, segundo...
Ninguém doma, a verdade do olhar oriundo.
Aconteça a espera, a esperança anoiteça
Nem esqueça assim.
A noite é uma criança, ainda chora por mim.

sábado, 1 de setembro de 2007

LÌNGUA SOLTA

A faca fere fundo
O grito corre mundo
Escorre sangue, escoa.
Calcando o chão do cotidiano
E as estrelas dentro da lagoa.
Da gruta gritam gemidos
Ferem o mundo
No coração dos desvalidos.
Ainda há guerra pelo pão
Ainda há mão pedinte
Ainda há boca dizendo não
A paz do dia seguinte.
A faca fere fundo
E mais profundo, a omissão.
Num gesto imundo
Acobertando do submundo
A causa da aflição!...

MARIA LAILA

Maria Laila
Bailla na areia,baila!
Até os coqueirais
Falam de paz nessa guerra.
E o amor sem eira nem beira
Se desfolha
Pela flor,pela vida inteira
E derrama-se na terra...
E Maria Laila
Baila na areia, baila!
Com os olhares e mares
Grudados nela.
E Maria Laila
Baila na areia, baila!
Até a lua
Com ciúme do sol
Veio pra rua ser sentinela...

PÉROLAS E PEDRAS

Nem foi arquiteto
E fez o céu seu teto.
Vezes muitas
Uniu riso e choro
E ainda sonhou...
No auge da realidade
Rolou a noite
Enrolou-se ao sonho
E o levou...
Hoje rumina-me distante
O canto atordoante
Da saudade.

VAIDADE

Infelizes
Dos aprendizes
Querem voar, voar, voar alto...
São concrizes
Árvores sem raízes
Não ousam dar salto.
Vaidade jorrando
Feito chafarizes
Fontes em crises
sob olhar incauto.
Em deslizes
Invés de vôo deslizam
Como rochedo
Em queda sobre matrizes
Veredas e asfalto
Gerando dores, cicatrizes
E sobressalto...