sexta-feira, 31 de agosto de 2007

INDIGNAÇÃO

Que querem, soldados
Se guardiões não podem ser?
Se pisam nas flores
Que jazem a florescer.
Que guardas, soldados
Senão essa fome de morrer?
Almas muitas de inconfusas vozes
Rompendo os grilhões algozes
Ressoam feito navalha.
Que temem, soldados?
Se no campo de batalha
Incomodam-te atos e gestos
Por que intimidam os protestos
Que também são teus?
Triste pátria amada
Que guarda a guarda armada
Contra os filhos seus...
(Do livro: "Berro do submundo"/1992)

A PAZ DO MUNDO

O mundo é uma fera
Correndo atrás da esfera
Que se denomina Paz.
E como não se satisfaz
Nem se autodomina
Mostra-se assaz
Inventando nova era.
Na guerra cotidiana subjaz
Se extermina sob farsa mordaz
Engole gerações a gerações
Em cada esquina.
A paz é essa esfera
Que a vida abomina
Quando não se degenera
Se autodetermina.
Não a vive nem prospera
Finge-se neblina
Acossada no abismo que gera.
Se digere, contesta e indisciplina
A fera não se compraz
Com outra fera.
Incurso vomita o que lhe apraz
Grita e vocifera.
Age e nega a todos que a pondera
E a torna incapaz
Ao que delibera e alcança
A paz gira a esperança
E o mundo gera a espera...

TRIGO ABRIGO

Ninguém
De tão só estranheza
Não fique perto.
Ninguém
De tão certo e certeza
Não viva incerto.
Ninguém, tão aquém
E tão refém
Debaixo de todos os sois
Preso a nenhum dos cóis
Livre de teto.
Ninguém melhor ou peor
Possa ser o próprio arquiteto
Da intriga.
Amando a dois senhores
No tapete a esconder dissabores.
Ninguém sem cinismo vive
De grado submissa escassez
Sobrepairar consiga
A dúbia lucidez
Desse rosto abismo.
Ninguém sem aviso
De tão riso, tão siso
Toma ciência consigo
E pelo trigo, castigo
Instigo e brigo.

O CIO DA FLOR

O poema
É uma flor sem rota
E isso só me basta.
O que me vale é o que brota
E sobre ele todo olhar pasta.
A flor em cio se nota
E tem dessa dor
Que me debasta.
Não se corta
Mas se quebra casta.
Cria horta
Que se devasta...
O poema
Não se importa
Com as pétalas caindo na vida
Que se arrasta.
O poema é uma flor
Que brota sobre todo olhar
E isso só me basta.

VISÃO CURUMIM

Pudim
Não é comida pra mim.
Feijão, sim, arroz e toucim.
Já dizia o velho Curumim!
Eita! Se intoca na toca
Faz tapioca pra mim!
Cuidado na oca
Senão, pipoca, pipoca!
Pipoca? Prefiro amendoim...
Roupa pouca, tá louca?
Touca não enche cabeça oca
Nem impede da idéia
Sair pela boca.
Taboca, maloca
Junta a oca
Veja que faz assim...
Nem seda nem cetim
Prefiro algodãozim...

CALEIDOSCÓPIO QUEBRADO

Olhei nos espelhos quebrados
A imagem refletida
Da vida desdobrada, repetida
E em vão, debatida emendada.
Juntei, possíveis e imagináveis, todos os limites
E a vidraça quebrada nos rebites
Desfinha tortuoso infinito
Da imagem duplicada do grito.
Era a vida, mal vivida, alimentada ferida...
Jogo de imagens feito figuras mal juntadas, agruras.
Torturas em cores mais enternecidas
E menos entendidas, trazem visões
Desencontradas, perdidas...

FIAPOS

Apenas um besouro contra a vidraça
Uma tempestade no deserto
Um grito, um agouro que se estilhaça
De um infinito perto.
Mãos inativas,cingidas lembranças
Võo sem bater de asa
Canto ao vento a ninar crianças
Volta ao mundo sem sair de casa.
Um olhar que tanjo, ao chicote da urtiga
Na saudade do banjo, sem remanjo se castiga.
Apenas um fiapo em pânico, brotando sem o vento
Um sonhar dinâmico, na súbta vaga do desvalimento...

TEGIVERSADO

Insiste, persiste, não desiste, não!
Chova foice, faca ou facão
Falando mais alto que o coração!
Sou bom na intriga, sou bom de briga
Há quem o diga, há quem não diga
Preferi pisar no chão!
Consiste no viste e não viste
E o dedo tão riste, vertido na indagação.
Tegiverso , não confesso em vão
Nem espora nem esporão
Submerso no porão.
Chova foice,faca ou facão
Perdido o berro
Que será da multidão?

DUAS PEDRINHAS

Morenas, duas morenas
Duas pedrinhas de açucenas
Enfeites feitos diademas
Nos dilemas da vida
Tornando amenas...
E o mundo vira escola
E o espanto o acalanto
Na beleza do canto da viola.
Morenas, duas morenas
Descaminho no desalinho
Duas pedrinhas perdidas na vida
Indulto de todas as penas!...

quinta-feira, 30 de agosto de 2007

BOTE DA CANINANA

A fila anda e desanda
Convém, comanda na banda de cá.
A fila desfila, perfila na vila
E destila por lá.
Rondando redemoinho
Dosando descaminho
Num bando sem alinho
Arrastando sem tornar.
Quando a fila anda
O tempo rola e sonda
Montada na roldana
Cavalga na onda
E o vento a se danar.
Haja visto quem suporte
Serpenteia sina cigana
Dando o bote na sorte
Feito a cobra caninana
A querer cobrar.
A fila anda, perfila
Na ciranda, na vila
Na varanda, em qualquer
Lugar...

ALVÍSSARAS

Ouço
O gemido das árvores
Nos troncos desvalidos.
Ouço os gritos
Ainda pasmados
De um povo perdido.
Nessa noite escura
Vejo as mãos brutais
Amordaçando
Amedrontando
E esmigalhando o despertar.
Vejo de comum andamento
No passo firme e lento
Manhã surgir...

DESESPERO

Aqui jaz um poeta
Mastubando-se em plena via pública
Num desafio a todo tipo de censura.
Em vez de luz que há tanto procura
Embrenhou-se na secura e azedumes
Que a vida é uma faca de dois gumes
Entrecortada de perjura,entrelaçada nesse fio
Que se diz costumes.
Aos olhos de espanto, de arquejos e solaios
Ejacula o sacrilégio entre desdém e desmaios
Na lisura de um riso paraplégico.
E, num adunar de gozo e loucura
Um acalanto subjaz, perdido perfura
O canto não de paz, de agrura
Onde não se reata a vida sem erro ou rasura.
Aqui jaz um poeta
Que refez de pasmo em orgasmo
A mais completa conjuntura!...

IMAGINÁRIO

Despe da túnica
A alma da lua.
E vê-se que flutua
Sem ser a única.
E sob o riso convexo
Se insinua banhar-se na rua
E o mundo perplexo.
Pela noite esquálida
Entre anonimato e boato
Esquisitamente nexo
Onde fálida
O simples fica complexo.
E vem calada e cálida
Plena e pálida
Na forma impensada
Do reflexo...

AMOR VADIO

Vem
No vento vadio
Desse sonhar!...
Zunindo
E zanzando no desafio.
Roda
moinho, roda
O tempo nem pode parar.
E gira
De jeito, gira
No aço
Do espaço
Sem braço de girar.
Momento
Do pensamento
Artesão do invento
Que quer brotar.
Paixão
Ferramenta da ilusão.
Contramão do coração
Emoção a tempestar.
Vem
No vento vadio
Desse olhar.
Zunindo
Zanzando
Imerso no cio.
Corre
Coração, corre!
Nessa pisada
Vou me acabar...

quarta-feira, 29 de agosto de 2007

TEOR

Nada há para se inventar.
As mãos não estão desertas.
Tudo se acha sobre a mesa universal
Que nos ilimita.
Redescobrir-se é gratuito
Exige o afoito e o fortuito
Tesão que jamais se evita.
Tem dor como parto
Anonimato e sem reparto.
Sonhar faz parte
Das ilusões incobertas.
Nada se deve ao homem e suas paredes.
Temos de usufruir da maravilhosa certeza
Dessa descoberta antes de se perder
A última gota de sede ...

EVA

Eva
Vira
Ave
Senta vôo.
Ave
Vive
Eva
Sente enjôo.
Eva
Viu nave de sonho
Na ave
Que vira serpente
E gira eva
Que abre coração
E leva
O mundo medonho.
Ave
Mundo afora
Enleva
Viva multidão.
Eva
Se perde na quimera.
E aflora na neve
Da ilusão
Que era...

JUDAS

Meia noite.
A tua sombra beija
A imensidão
Como sobejo derradeiro.
E tinhas às escondidas
Trinta dinheiro.
E nada pode comprar-te
O sono
E nem devolveu-te do abandono
A paz perdida.
À meia noite
Cantou o galo em pleno
Remorso e escuridão.
E não negastes vida
Ao fruto da traição.

VIAGEM

Lugares
vulgares cruzarei
Noutros mares.
Mares
Dos olhares cruzarei
Noutros lugares.
Lugares
vulgares cruzarei
Nos olhares.
Olhares
Vulgares cruzarei
Outros lares.
Lares
Vulgares cruzarei
Noutros lugares.
Lugares e mares
Cruzarei
E velarei
Os olhares...

PERIFERIA

Abocanhados perecemos
Engolidos pelas enchentes.
Somos tantos
E para os olhos de muitos
Displiscentes.
Sonhamos
No real sobrevivemos.
Obscenos que somos
Ameaçamos as vistas
Dos turistas
E corremos na lama
Com os farrapos e migalhas
Que nos atiram.
Somos da outra margem
Envergonhamos a nação
Com nossas casas de palhas
E taperas.
Somos manchas ideléveis
Grotescas de favelas
Que se agigantam
Viemos da secular injustiça
Produto da mais valia.
E nossos gritos ressoam
Feitos facas e navalhas...

GUARDIÃO

Não quero calma
E sim o irritável
O anormal, o inquieto
O que doa e dói.
Não busco o imutável
E sim o que rompe, mói
Quebra, arrebenta, explode
E transforma.
Torto
Como o canto louco
Obsceno
Como a geometria do tempo
Morto
Que só deforma.
De caminhos a desalinhos
Disperso, de sólidas faces
Gravoso.
Sórdido, mórbido
Como queiram chamar, afora
No entanto, vivo
Atordoante, ativo
Angustiado, esperançoso.
Quero garras agredindo
Unhas afiadas, dentes rasgando
E guerra nessa paz.
O "sub" do subexistindo
Bem longe, indo.
Um invertido amor quebrando
Uma sub-ordem que quebra a ordem
O alvoroço.
A subversão enfim, a morte desse fosso.
A alternativa única viável, a desordem
O sustentáculo dos que sonham amanhecer.
A paz que suplanta, o grito na garganta
A vida desafiando inteiras noites a fio
E não a paz de calamidade tanta.

CATADOR DE PALAVRAS

Vento frio
Peixe, rio
E mar.
Vela, pedra
Sol e lua
Momento de amar.
Rio nos olhos
Caminho aberto
Areia, sol,solidão, deserto
Vento nos ferrolhos
E no ar.
Gesto, alma
Sonho, silhueta,calma
Palavras pra remar.
E afora isso
Nada mais tem
Compromisso
Aventuras do presente
Sem ser preso aos dentes
Das indiferentes posturas
Desdenhadas em agruras
Fincadas nas loucuras
Do coração.
Vento, tempestade
Balançam turfão.
Eu, moribundo
Cato no mundo
As estrelas caidas
Do chão...

terça-feira, 28 de agosto de 2007

NEGRETUDE

Ainda dizem: " minha cor!"
E se penalizam da minha dor
Que é só minha...
Ainda, sempre ainda
Que essa farsa não se finda.
E falam da minha dor," dor de negro,"
Dizem, mentindo do amor a cor
Da fantasia que alegro.
E zombam:Dor de negro são artimanhas!
E ainda, das chibatas, às costas carrego
As cicatrizes tamanhas!
Ainda ,sempre ainda
Que a dor não se finda...
E às costas levo há séculos
A segregação do sonho
Ainda às escoriações me ponho
Nas discriminações de rotina.
E carrego no choro das gerações
A fé e a sina.
E por ser medonho
Ainda sonho!...

ABUMINÚRIA

O mal foi acreditar
Que a flor desse mel
Ou, por se achar no céu
Poderia confiar...
(Ai,como estava no fel!...)
Esqueci de pisar no chão
E era o chão que dava a lição.
Não foi o fácil sorriso
Disfarce de paraiso à emoção.
(Ai,que imensa aflição!...)
E, mal tirei o fardo do ombro
Por sinal achar que venci
Revi a dureza do tombo
E vi no escombro, afinal

Todo o meu mal....

BERRO DO SUBMUNDO

No engano se foi
Foi mudando o mundo
Foi-se propagando
No mundo mundano
Foi-se pano de fundo...
No dano se foi
Foi berro do submundo
Parido imundo
Retido no encano
Do grito profundo.
Profano foi
Profano foi o seu nome
Resistente a fome
Presente, sempre presente
À frente e a fundo...
No berro que foi
Foi grito e palmatória
Foi-se refazendo a história
À roda girando livre, livre
E palmares de agora
Escutando de outrora
Zumbi ainda vive...Zumbi ainda vive!
No berro que foi
Foi berro do submundo
Mordendo o imundo
Rompendo punindo
E ainda pune: Zumbi ainda une..
Zumbi ainda zune!

RELUTÂNCIA

Fica
Fincado
Renitente e forte
Nó em pingo dágua
Feito faca de corte!
Fica
Fincado
Renitente e forte
Estrebuchando a mágoa
Sem temer a morte!
Fica
Fincado
Renitente e forte
Sem ficar parado
Renegado à sorte!
Fica
Fincado
Renitente e forte
Crava a voz no canto
A erguer no porte!
Fica
Fincado
Renitente e forte
Sem medo da hora
Desaprume, desentorte!
Fica fincado
Renitente e forte...

segunda-feira, 27 de agosto de 2007

SUBÚRBIO

Morre a cidade
Enquanto a gente escorre
Para o subúrbio.
O pisca-pisca da noite
Conforta a fadiga
Da espera sem fôlego
Que se liga no córrego.
A verdade é que se morre
Enquanto delinquente
O tempo corre.
Enquanto a gente escorre
Sem que nos socorre
Quando diz: Ou a vida ou a cidade?
Fica a cidade e a gente escorre
Fica o tempo e a gente morre...

UIVOS

E as sementes
Debaixo da terra
Esperam o momento
Das águas.
E o olhar atento da serra
Não se turva às mágoas.
E criando rebento
E o vento uivando no ar.
Molhando as pedras
Com as águas do mar!...
Reviravolta
É o sonho que vai e volta
E torna a voltar!...
E a revolta do mundo
Correndo num segundo
Sem nada lavar.
E quando cai, vira semente
De se plantar!
Reviravolta
É o sonho que quer voltar
A água quando vem
Não faz pergunta
E se junta pra regar...

JANELA DA ALMA

A janela da alma se abriu
E deixou-me voar o pensamento.
E em gestos floriu-se depressa
Que apressa o sentimento.
No improviso me desfio
Espalhando amor em pedaços.
Bate o coração a esperança
Encarcerada em olhos mil
Disparada em abraços.
E assim com os pés à fio
Pude transpor o momento
Da guerra que mói o vento
E tão depressa, apressa-me o rio.
A janela da alma se abriu
Apenas tateando tento
Da janela do mundo que não viu
Despencar-me em advento
Um por um, os sonhos!
De tão medonhos em desafio
Mais profundo.
A janela da alma se abriu...

domingo, 26 de agosto de 2007

ROSA DO DIA

Ao acaso
Não plantei a rosa.
Foi caso à parte
De uma prosa.
Instante raso
Não se reparte.
E feito arte
Ou se divide em glosa.
Se fez famosa
Rosa fulana,fulana rosa.
A rosa do dia nasce
Sem ser plantado
E o mundo todo
Ao seu cuidado
E corre pra noite
Se faz ocaso
E o mundo todo
Vira seu vaso...

TRENZÃO

Passa por cima do sentimento
Coração, água e cimento
Cascalha de momento
Vida levada
Ao vento.
Do mais profundo
Oriundo
Gira em torno
Do sustento
E num segundo
Roda ao mundo
Na roda do pensamento.
Um minuto de agruras
E tão astuto nas aventuras
Como fosse entretimento.
Alma de fora
A topar no muro
Toda hora
Verdade evasiva
Evapora
Sentindo-se tão isento.
Nesse trem viver intento
Onde ora ou sirva
Traz trauma e tormento
A vida olvida a deriva
Mesmo renhida
Sem retento.

sábado, 25 de agosto de 2007

VENENO VITAL

Para o amor
O veneno da razão.
Para a paixão
O pequeno antídoto
Da ilusão.
E assim do ciume
Como fosse perfume
Poluimos o coração.
E nem polimos a vida
E exigimos do sonho
A mais renhida
Canção...

PORQUE É PRECISO

É preciso não ficar
CALADO.
Isso só não basta.
É preciso não só gritar
Fazer-se ESCUTADO.
Porque eles fingem
Não nos ver.
E se nos enxergam
É pela sua conviniencia.
Mas é preciso da nossa INSISTÊNCIA
E, sobretudo,termos CONSCIÊNCIA
Da força do NOSSO EXISTIR.
Por isso exista.
E mais do que isso: VIVA!

SONHO

O sonho
Que me cabe
Não me cabe no sonho.
Vejo-me abonar-se
Acho-me medonho
No que gabe
E só meu sonho
Nada sabe.
Somos margem, guarida
Somos imagem, vida
Miragem, engrenagem
Renhida...
Almas que se esgarçam
Se traspassam, se perpassam
E esvoaçam
Em si.
Somos rios em desafios
Delírios, desvarios.
Somos desvios, invios
Do desejo febril
Que ri...
Não me cabe
O sonho
Que me cabe
De tão medonho
Ninguém sabe.

BURACO NEGRO

Atiro
Música no firmamento
Desafiando a cosmofagia
Nem macro, nem micro, banais.
Apenas pensamentos
Mesclados em palavras
E notas musicais.
Sem imagem
Que nos assombra
Do ínfimo ao todo
E nada e tudo desiguais.
Atiro
Música pela utopia
Da rala ralé
Onde do alicerce
Se auto-exerce
E alombra.
Sobrevive-se pelo furo
Òrfão de mídia e perfídia
Ao insano escuro.
Reviro e giro
Sem sombra.
Atiro
Porque apenas sonho...

DILEMA DO SER

Passe o impasses
Possa, apossa.
Se o que fica
Ou ficasse
Fosse só fossa.
Pela força que força
Fosse o que fosse
Mais passes
Mais impasses
Mais posse.
Passe o que passe
Possa o que possa
Porque passa, passa
E senão passa, apossa.
E no que fica
Ou ficasse
Passasse o impasses
Da fossa...

DIA DE PULSO

Sem rumo
As águas me atiram futuro.
Sem amor de céu
Só pedras de furo
Acossam-me o sonho
Entre muro
E vão medonho.
Hospedei-me no dia de pulso
Canta em mim
A poesia sem fim
Aprendi viver incurso.
E tudo se foi inesperado assim
Debelado do limite...
Inexiste o volver
Do jasmim.
Avuou o pássaro
Que amei sem protestos.
Nunca tão pobre e sozinho
Fiquei.
Dói-me tudo até os últimos gestos.
Decaidos, sem contestos
Sem amém.
Sem rumo,serei estrumo
Também.

VELÓRIO DO RIO

O rio
A vela
O morto
Entrelaçam-se sem sentido.
A vida
O barco
O leme
Passam despercebidos.
O rio e o leme
O morto e a vida
Perpassam o que teme.
A vela e o barco
Têm destino num só sentido.
Pela memória pervagando
O pranto sem acinte
A esquecer o pavio da noite
Que acende o dia seguinte.
Na vontade do açoite
O rio vela o morto
A vida
O barco
O leme
E todo sentido é torto...

sexta-feira, 24 de agosto de 2007

BARQUINHA DE PAPEL

Vai o tempo levando
A barquinha de papel.
A correnteza dessa vida
Turva aguda renhida
Tão desleal, tão infiel...
E lá se vai a barquinha de papel
Pelos córregos da rua
Na sorte que flutua
Nas curvas formando carretel.
Éramos crianças,éramos adultos
Rolando nos sonhos vultos
Bolinando o borel.
E não nos sai das lembranças
Nem perde as esperanças
A barquinha de papel.
Ao sopro do desatino
Movido a fel e mel
Rodopiando o menino
Nas águas, na terra e no céu...

O OLHAR DESSA MULHER

Por dentro me arranha
O olhar dessa mulher
Me leva subir montanha
Me faz viajar a pé...
E ao ventar-se tão estranha
Feito enchente na maré
Me invade, me assanha
O olhar dessa mulher.
E perquirindo sanha
Pela frente e não de ré
Vontade que me apanha
Ladeira, cio sobe e desce inté.
E varando cortina dágua
Na hora que tora toré
Assim contramão da mágoa
Desafia o banzé
Levando tudo da entranha
Tesão botando a fé
Me invade e me assanha
O olhar dessa mulher
...

quinta-feira, 23 de agosto de 2007

GRANIZO

Os olhos do céu
Doces iguais ao mel
Rasgando esse véu
Mostra como fosse seu papel.
Momento diviso
Queda de granizo
Choro e riso
Essa fé que reviso
Contra-fé em juizo.
E os ventos aos olhos
Uivando tormentos
Rebentos e abrolhos
Levando aos ferrolhos
Sibilinos avisos.
Aos tempos atentos
Chuvas de granizo
Nos recolhem em abrolhos
Retentos sem escolhos
Sombrio juizo.
Os olhos no frio
Sonhos em desvario
Fel em granel.
Coração tão largo
Amargo tão fel
À léu e sem riso.
Os olhos do céu
Rasgando esse véu
Feroz e infiel
Impuro e conciso...

PONTEIRA

Rodo,rodo a noite inteira!
A solidão corta que nem facão
E brilha que não é brincadeira
Aquecendo o coração
Feito fogo na madeira
Na ponteira da solidão...
E eu, homem- menino
Sol à pino no olhar desolação...
Rodo,rodo que nem pião
No mundo da ponteira
Brincando de solução
Rodo,rodo a noite inteira
Na ponteira da solidão.

BRILHO DO OLHAR

Lá onde vi o lampejo
O grito de amor e desejo
Onde o vento ficou morno
Pouco sem corpo e jaz sem retorno...
Lá onde a dignidade se perde
Em troca da vaidade
E a inverdade campeia.
Vi,sim, em todos olhares o sonho
E tão medonho inocentemente tateia
Indo além ou indo aquém
Sem saber quem o freia.
Lá onde a imensidão
Tem corpo e alma sem dimensão
E a calma da multidão serpenteia.
Há grito ao exaustão
O medo tem devoção
Feito foice na escuridão
A luz reluz e clareia.

quarta-feira, 22 de agosto de 2007

PERSPECTIVA

Quem
Será o mar
Para o peixe
Que sou?
Quem
Será a árvore
Para a semente
Que tento ser?
Quem
Será a chave
Da porta
Que tento abrir?
Quem
Será o fogo
Para o incêndio
Que vivo?
Quem
Será a alegria
Para a lágrima
Que me morre?
Quem
Será a água
Na sede
De meu deserto?
Quem
Será a flor
No espinho/rancor
Que vai se aplacar?

REZADEIRA

Minha reza tem sangue
Flores e pétalas no chão.
Tem o azedume do exangue
E o ciume do coração.
Não dá conta, que conta não tem
Pirraça desgraça que convém
Rosário sem conta, vigário do desdém.
Ladainha que traz farinha
O vinho, o melaço e o pão.
O suor do que convinha
O grito, o punhal e a traição.
Minha reza vive mudança
Tem a fé bisbilhoteira.
Sorriso e lágrima na esperança
O gozo no olhar da feiticeira...

ISCA

O rio vira mar
E o mar vira onda
E vem o arrebol se banhar...
Até esse sol virar lua
E até a lua virar sol
E a noite naufragar...
feito ondas nas pedras
E pedras nas ondas
Vou martelando sem parar...
E fincar nesse farol
E o tempo me dizer até quando durar...
Escutar alarido
Do sono garrido,banido de mim.
Pescador, também sei pescar,também sou assim.
Trafego no mesmo rol
Pelas bandas do atol, na mão e contramão
Onde viver faísca
Usa de ísca
O coração...

terça-feira, 21 de agosto de 2007

ME LEVE, ME LEVE

Me leve pra casa,me leve
Ou aonde voce for
Me ponha tão leve
Nas asas do seu amor.
Seja breve, seja o que for
Do verso reverso ferve
No verve do amor.
Nas paralelas do norte
Águas belas têm suporte
Cores vivas, sim senhor.
Cores vivas aquarelas
Acolhidas das procelas
No sorriso e na dor.
Me leve pra casa, me leve
Ou aonde voce for.

DAMA DA CALÇADA

Pai,essa rua eu nunca quis.
Esse lar eu não o fiz...
E sobre mim pesa tamanho fardo
Vender o corpo para nutrir os filhos
E me ardo na dureza desses trilhos.
Ser a "dama da calçada" no enfrento
Ao rufianismo: "mulher de vida fácil!"
Não,não me deixa otimismo
Nessa rua tão difícil...
Os olhos me julgam mas não me intimidam.
Os meus os revidam e escravos ao corpo os tenho.
Mantenho sóbrio a consciência
A ciência da paz jamais falta.
A luta é longa e inglória
É preciso nessa palmatória
Para saciar a "a besta" fazer-se peralta.
Entre solidão e confinamento
Não tenho momento nem para exaustão.
Pai, ser mãe no esgotamento
É despir-se da própria alma
Rasgando o constrangimento
No riso "coisificado " da calma...

GARI

Da alegria nutria mucho
Desde guri.
O embucho
Que azucrina o gari.
À revelia do bucho
Do lixo
Catar luxo.
Da alegria nutria embucho
Desde de guri.
Ser mucho
Que azucrina o gari..
Ser bucho
À revelia do bicho
Do luxo
Catar lixo...

GARI

Da alegria nutria mucho

Desde guri

O embucho

Que azucrina o gari

À revelia

segunda-feira, 20 de agosto de 2007

JUGO DO TEMPO

Entre sangue e feses
Caem no chão as teses
Na lição dos revezes
Caminhando se vive e aprende
Maior que a dor que fica latente
É fingir que nada sente
Do amor que de nós não
SE despreende.
E todos carregam consigo
Não façamos do pão o jazigo
mas lume da libertação.
Para que em vão
Não secanse a canção
Desfazendo-se do amor
Emanado da precisão.

OPERÁRIOS

Teu caminho de suor
Não basta apenas
Tens o peito de cascalho
Aço e cimento.
Teu caminho de faminto
Não basta apenas
Tens em vez de sonho
Exaustão e ferimento.
Teu caminho de gozo adiado
Não basta apenas
Tens em cada pedra,todas as pedras
Do caminho e monumento.
Teu caminho de medo trópego
Não basta apenas
Tens na mão a raiva
O berro e o arrebento.
Teu caminho de fôlego
Não basta apenas
Sem a consciência como rebento.
Teu caminho de operário
Não basta apenas
Sem a luta como fiel instrumento...

BRISA E MORMAÇO

Brisa, brasa
Brasa, brisa
Assopra e queima
Brasa brisa
Alopla e teima
Brisa ,brasa
Na minha casa
A fome reina
Brisa, brasa
Assopra arqueja
Inquilino da sorte
Virgília da morte
Abraça e beija.

PALAVRAS SEM RUA

Palavras sem rua
Transeunte sem passos
Cúmplices da lua
Criando compassos
Exilado no poema
Palavras sem teto
Isento de veto
De ato concreto
E cio indiscreto
No riso sem lema
No afeto sem pouso
No repouso em brasa
Voando sem tempo
Contratempo sem asa
Na batida da vida
Sim,palavras sem rua
Minando -me a casa...

PALAVRAS TRANSEUNTES

Gasto
O gesto
No resto
Do rasto
Que engasto
E indigesto.
Detesto
Debasto
Me gasto
Me resto
Me arrasto.
Gasto
O gesto
Arrasto
O resto
Debasto
Detesto
No contrasto
No contesto
O rasto
Indigesto
E me engasto...

CONFRONTO

Somos a precisão e o sustento
Num sonho de um pássaro
Que alto voa.
E por cima de colina e abismo
O mesmo pesadelo sobrevoa.
Você, o par que faltava
Eu, o número ímpar que se completa.
Nos teus seios me abstraio
Para não morrer de sede.
Voce se agarra na minha fantasia
Para não morrer de fome.
Há enganos e cautela
Agonia sem nome que nos desmantela
Na cabeça do mundo e seus cabelos
Deixam-me emaranhado
E sem saber como detê-los.
Na mesa somos vários
Um pesdindo outro negando.
Na cama somos dois num só
S e oferecendo e se doando.
No amanhecer somos múmias
A divertí-se com a precisão alheia.
De dia, o desencontro, o confronto
À noite nosso corpo,nossa ceia.
Tenho a convicção e voce a dúvida
No sufoco,apego-me a verdade que ainda vive
Voce oprime, comete crime que convive.
Há um abismo e uma ponte
Entre nossa vida e a traversia olvida.
Há o pesdelo e o medo pairado em nós
Se fazendo corpo e se fazendo voz.

domingo, 19 de agosto de 2007

DESCUIDO

Um olhar foi bastante
Para que tudo acontecesse.
Arrastou-me o desejo por toda noite
E, como açoite, caiu em raio
Sem que ninguém soubesse
Do desmaio
Que levou consigo todos olhares.
Enquanto a rosa suspirava
A manhã de todos os lugares
Um olhar foi bastante.
E carregou todos os ares
Todos os falares
Enquanto no descuido
De um instante
No amanhã que nem se sabe
O olhar foi bastante.

A BATALHA DIÁRIA

A aflição nos retalha
Calando o sonho
Em tapas e etapas
Quer-nos tristonho.
E insiste medonho
Cobrir-nos de mortalha
Diminuir-nos em falha
E esquece que o sonho
É a constante da vida
A rasgar definida
O equilibrio
Da sombra assaz.
E nunca se reduz
E nunca se assombra
Porque é luz, vida que se espalha.
E vida não quer paz
Exige batalha...

ROSÁRIO

Beijo
Que não desaponta
Desponta
Desejo
Dentro de mim.
E me remonta
Assim
Conta a conta
No rosário
Sem fim.
E monta
O ensejo
Do amor em arquejo
Que só conta
No fim.
Beijo
Que não acaba
Desaba
Desejo
Dentro
De mim.

sexta-feira, 17 de agosto de 2007

OLHOS ABERTOS

O amor seguinte
Tem-me os olhos abertos
No século vinte.
Só meus desertos
Rosnam acinte
Aos que saltam
Milênios libertos.

Paixão pedinte
Amores desertos.
E não me cortam
Os cacos de vidro
De olhar requinte.
Amores movediços
Represam compromissos
Certos.
Amor seguinte, no seculo vinte,
Olhos abertos...

AO AMOR PROIBIDO

Teus olhos não me dizem nada
Teu corpo me transporta.
Não desfaleço
Porque sei da estrada e do começo
Quando se fecha toda porta.
Teus olhos não me dizem nada
Na voz calada de toda aurora.
Sinto e passo como a luz
Que passa toda hora.
Teus olhos não me dizem nada
Quando na calçada se corta.
E a mudez tem mais fala
Do que quando não se cala
O olhar que nem se importa.

PRIMAVERA

Eu me lembro,eu me lembro
Sob o céu de uma manhã
De setembro.
Havia um cheiro de rosas
Espalhando risos
Membro a membro.
Não era da calma
Na minha devera primavera
De carne e alma.
Não era início nem fim
Um ordem nascia sobre mim:
Primavere-se! Primavere-se!

O CIO DA FLOR

O poema
É uma flor sem rota.
E isso só me basta.
O que vale é o que brota
E sobre ele todo olhar pasta
A flor em cio se nota
E tem dessa dor que me debasta
Não se corta
Mas se quebra casta.
Cria horta que se devasta.
O poema
Não se importa
Com as pétalas caindo na vida
Que se arrasta.
Poema
É uma flor que brota sobre todo olhar
E isso só me basta....

IN-MARGENS

Imaginas os marginais em cenas...
Imaginas as cenas nos jornais
Imaginas as imagens dos poemas
às margens das páginas marginais.
São imagens, são cenas
Nos poemas marginais.
São imagens, são cenas
São gritos rasgando editoriais.
São imagens, são cenas
Dos poemas marginais.
Imaginas as imagens, as cenas
Do outro lado das imagens assais.
Perversas sem ilusão
Em imagens...imaginação.
São poemas das margens nas cenas
Das margens nas cenas reais...

BERLINDA

Éramos dois corpos sem sentidos
Éramos dois planos desencontrados
Éramos sem senso e pervertidos
Éramos enganos e enganados.
Éramos paixão chamada esperança
Éramos multidão e vivíamos privados
Éramos razão que ao abismo nos lança
Éramos sonhos de encontros minados.
Éramos solidão e vivíamos cercados
Éramos exaustão, noite que não dormimos
Éramos visão de olhos fechados
Éramos prazer que mal sentimos.
Éramos de fato e ato, amor que nosso não era
Éramos sonhos um do outro, estarmos de braços
E se encontramos como podera
Mesmo achando fora de tempo e espaços.
Éramos paixão quando as águas rolavam
Quando as lágrimas secavam, éramos indagação.
Éramos renitentes e presentes torpos
Ficamos como devíamos,não fixamos nossos corpos
Senão éramos amor,...Não éramos só ilusão...

AGOSTO

Com gosto ou sem gosto
Agosto...
O sol cai e se levanta
Em tantos caminhos
Em horas tantas.
Planta espinhos
Em flores encanta.
E não há desgosto
Ou mesmo mágoa
Que não deságua
Nas águas de agosto.
E vendo que pouca mão alcança
A espera passa , fica a esperança
No tempo imposto.
Com gosto ou desgosto
Agosto...
E o sol deposto
Brilha indiferente
No outro dia posto
Cruzando o horizonte
De cada posto...

LÁGRIMA

A dor
Que ora crava
Crava lavra
Na contramão.
É lágrima
É lástima
É lavra presa
Escrava da aflição.
E corre e lava
E corre e cava
A minha imensidão
Que a lágrima
É palavra do coração...

TEMPO BRUTO

Arranco travanco
No entanto manco.
Espanco espanto
No entanto estanco.
A vida também se tranca.
Querda no tempo
Que ao tempo impanca.
Arranca travanca
Destranca tranca
Deixa correr que a dor estanca...

CHUVA E SOL

Com a lingua de fogo
Lá vem o sol
Rasgando as núvens
Tocando fogo no dia!...
Lá vem a chuva também
Com seu enxerimento
Puxando o sol
Para se amoitar nas nuvens
Se valendo do frio e do vento...

A BOMBA

Eu tenho muito medo da bomba.
Não a bomba que assola paises em guerra
Ou, a que intimida a paz colocando pavor na terra...
Mas a bomba extremamente silenciosa
E mais perversa ainda: aquela sorrateira
Trapaceira que faz a justiça tendenciosa.
Não a bomba atirada em Hiroshima, Nagasaki
Ou no Vietnã ou no Iraque
Nem aquela em Atlanta detonada
Ou mesmo a explodida no Rio-center.
Não, nem aquela no envelope enviada!
Eu tenho medo da bomba que só atinge inocente
E fere a dignidade e impunemente campeia na cidade.
A bomba que mata de fome e horror no Nordeste.
Não a que provoca peste ou a falta de safra.
A mesma que massacra na Biafra e obriga a pedir esmola
Aquela que afasta criança da escola e a leva a inanição.
A bomba da indiferença, da omissão.
Aquela que cala, engana e nada sacode.
A bomba que está em nós mesmo
E não explode!...

SENSUALIDADE

Teu rosto
Tem um sensual exposto.
Profundamente
Mexe
No coração da gente.
Instinto e labareda
Acesos
Queimando a seda...
Teu corpo
Já se expele
E nem o tempo
Há que nos atropele
E já não esconde
Instinto e amor
Acesos
Queimando
Não sei onde...

VAGALUME

Por si só
Lume.
Por ser só
Vaga.
Só por ser
Vagalume...

VENTANIA

Vento, ventania!
Passa, fica,passa
Faz alento
Pirraça cria.
Vento, ventania!
Passa, fica, passa
Só não passa
A rebeldia.
Essa nos enleva
E irradia.
Nos leva às horas
A deixar o dia.
A se fazer vento
Ventania.
A forjar tormento
De ser de tudo, ou quase tudo
Guia.
Da senha, da sanha
A alegria.

ESPAÇO

Sou uma cidade sem tempo presente
Sem passado ou futuro
Sem viaduto, ponte ou muro
Sem labareda ou escuro.
Constantemente assevera e penso
E às horas ameaço.
Dentro de mim reside o imenso
Onde me dispo e me cubro
Insistentemente descubro meu espaço.
Não tenho arranha-céu nem casa de taipa
Não existe latifundio nem favela
Possui para o exterior larga janela.
Há uma usina de pérolas no chão da vida
Limpa do medo ou ódio.
Lapidá-la é tão necessário quanto vivê-la.
Pare! - Diz o mundo. Eu digo: - Sonhe!
E a vida não há como detê-la...
Não sou uma neblina, levemente uma esquina.
Um beco de uma viela que se alarga de lágrimas
Pelas lástimas inunda favela.
E as palavras se despem sem censura
Andam nuas conversam com a lua e criam ruas...

quinta-feira, 16 de agosto de 2007

RECADO

Em qualquer canto da cidade
Em qualquer momento
O peito marginal pode explodir.
E o lixo de vida que nos encobre
Nos coíbe
Nos dilacera em mágoa.
E amantes seremos por resistir
Até a última gota dágua.
Em qualquer canto da cidade
O peito marginal pode explodir
E amantes dos amores proibidos
Plantados em qualquer canto
Viveremos a liberdade
Em qualquer momento.
E não negaremos por negar
À revelia dos que nos perseguem
A bala de vento, cria-nos rebento
Elimina o medo do olhar nas sombras
E nos assombra menos a guerra
Que a tua paz.
Em qualquer momento
Em quaquer canto da cidade
O peito marginal pode explodir.

ENTRE FUMAÇA E CINZA

Virou cinza
Vontade ranzinza
Virou cinza!
Feito o dono do sono no abandono.
De afoite sem rumo
Desaprumo no açoite
Pelo prumo e acoite
Fumo da noite
Vira fumaça, insumo e desgraça!
Zanza na asa
Zambo de sono
Sem casa ou outono
Assim sumo e assumo.
A flor da vida, nem olvida
Tão belo, no supérfluo, tão relo
Sem fim em si assim...
E o sumo passa
Perpassa pela graça ranzinza
Vira cinza!...

DESAMOR HODIERNO

Quebre-se o relógio
Marca-tempo, marca-passos
Passos dos impasses.
Sem hora de partir
De chegar, trespasso
Transeunte o tempo
No cansaço do querer
Do compasso a insistir
A viver, perpasses.
Assim sendo, nem compreendo
Do prazer eterno
Nulificado no estupor
Além do inferno
No hodierno desamor
Das classes.
Quebre-se relógio
Marca-tempo, marca-passos
Rasgue-se a estação
Faça-se compassos
Pelos passos do verão
Do inverno, sem disfarces...

PUNHAIS

No escuro o brilho
Vira espelho
Sangra em desatenção
Quente e vermelho
Escondido no veneno
Do coração
Inseguro do sereno
Fere por tras do muro
À traição.
À noite,cada clarão
Esconde-se na curva
Quando longe se turva
A visão.
A hora não dorme
E a manhã insiste
Consumir enorme
O que nem existe
A exaustão.
A guerra e a paz
Dois punhais, se buscando
Na multidão...

quarta-feira, 15 de agosto de 2007

O VELHO RELHO

O relho do pensamento
Está no vento, está no vento
No tal cruel esquecimento
Na mão do tempo,na mão do tempo...
E o pentelho do momento
Vive contramão do contratempo
No tal cruel discernimento
Do que rola fingimento!
E, regrando esse tormento
Bate o seu rebento
No vão esquecimento
E vão no esquecimento...
O relho do pensamento
Está no vento,está no vento
No tal cruel esquecimento
Se não ha outro invento
Que tanto tento...tanto tento.

MÃOS DIVIDIDAS

E eu não posso viver de fora
Sem que me sangre o coração.
Aflora-me o peito, aflora
Com o suor rega o chão
No desencontro de quem deplora
Vôo mesmo a contramão.
Aflora-me o peito, aflora
Vai, desveste a solidão.
Instiga esse amor, instiga
Rega, rasga aflição.
Planta o grão, colhe a espiga
Transforma o trigo em pão...
Só as mãos amigas não podem ser
Divididas, não...

terça-feira, 14 de agosto de 2007

PEDRADAS

As pedras
Têm as suas regras
Quebrando regrass
Pisando em pedras...

Abolindo regras
Atirando pedras
Inventando regras
Catando pedras...

E, antes que esqueça
As regras são pedras
Na cabeça!...

PÓ NO POEMA

Não tenho mais intestino
Para enguli sapo
Para trafegar na mentira
Navegar na adversidade e na ira.
Tenho uma vida
E vou ve3r se dela escapo...

Não tenho mais fôlego
Para correr,correr sem chegada
Para esperar do inacreditado
Não tenho mais ombro a ombro, lado a lado.
Tenho uma vida
Que indigesta trânsito na parada.

Não tenho mais corpo
Para aguentar flagelo e cicatrizes
Para descaminhar sem desmantelo
E seguir diretrizes
Para descarar certeza em cacos.
Tenho uma vida
Que concebe ideologia e idolatria
Farinha do mesmo saco...

NEM SEMPRE LIVRE...

Vez por outra
Esqueço da comporta
A liberdade não tem volta
E o que é livre
Mal se guarda e se solta.
Vez por outra
No remoinho esqueço a vira-volta
E o que é livre
Não se esconde atrás da porta.
Vez por outra
Lembro de entreaberta porta
Que liberando prende e escolta
Se o que é livre
Mal se guarda e se solta...
Vez por outra,vez por outra...
Me bato com tanto sonhos à viravolta

PRECISÃO

Cadê o pão
Que lavro de meu suor?

Cadê o pão
Que lavro do meu suor?

Cadê o pão
Do meu suor?

Cadê o pão?

Cadê?

O VENTRE DA MÍDIA

Olha a farsa bruta
Guardiã da luta inglória
Com a navalha-revelia
A rasgar no dia-a-dia
Do povo a história...
Olha a hipócrita servil
No massacre tão sutil
Dando a mão a palmatória.
Olha o samba no mangue
E a mutuca no sangue
O vexame, no arame
Chame,chame o enxame
E a mudança caduca...
E na utopia trafega
E a rebeldia carrega
Essa chama maluca.
Mas,...Que seria de todos
Se todos não acendessem
Essa essência na pele
De cada quintal?
Em vez de demência
Um gesto, como rasgo vesgo
De um gasto final...

segunda-feira, 13 de agosto de 2007

PARAÍBA NOSSA DE TODOS OS ENGANOS

É assim que vejo a Paraíba
Crianças famintas, sem escola
Bebendo a esperança da mata Atlâtica.
Adultos desempregados
Desesperados como caranguejos de andada.
Favelas crescentes
Acomodando o brejo e o sertão
Todos com o coração em flagelo
Se apoiando no rio jaguaribe poluido
Que costura a seca dos políticos
Inescrupulosos.
É assim que vejo a Paraíba:
Com a fome escalando a serra
Da borborema.
E o canal da redenção pintando
Com a cor da mentira
A esperança do povo.
E no rio de sede boiam os peixes
Em me deixes que não caem do céu
Como gado que jaz em paz.
É assim que vejo a Paraíba
E nada é novo.

URUBUS

Os urubus
Inundam o oceano
Das nuvens.
Trafegam canção
Traficante de incertezas
E treva imposta.
E, abrindo o ventre
Das incautas correntezas
Sem diálogo serve o medo
Na mesa posta.

NUVENS

Toda nuvem é diferente
Quando passa.
E toda nuvem nos atrai
Nos faz comparsa com suas cenas.
Todas nuvens já passaram
E passarão apenas.
Porém sempre nuvem sem destino
Nos traz e conta seu problema.
Todo poema é diferente
Em seu dilema
E não se faz indiferente.
Vindo ou indo
Fica com as palavras das nuvens
Quando passam
Em desatino...

PASSOS E VENTO

No passo desse vento
Eu canto , eu laço
Isento não fico
Do tempo que vira passo...

Tempo voando
No vento pássaro
Passarão
Tempo e tormento
Com medo do abraço...

Vento voando
Nas asas dos pássaros
Passarão
Tempo e tormento
Ventilam no mesmo espaço

Vento voando
Nas asas dos pássaros
Passarão
Tempo e tormento
E matam rebento
Impedem de criar laços...

terça-feira, 7 de agosto de 2007

PÃO

O pão que se come
Consciência que se cria.
O sangue que corre
Sonho que se amplia.
A mão que se caleja
Suor se redimia.
Do suor nasce o pão
Da ausência, a rebeldia.
O pão
A mão
O sangue
Forjam o grito
No dia-a-dia...

MODERNIZAÇÃO

Num ato drástico
Matamos a rosa
E usamos depois
A rosa de plástico.

CICATRIZES

O silêncio escreve cicatrizes
Refaz a dor pelas raizes.
Ao mundo fez refém
Ao pé dos sonhos
Jaz também
Medonhos
Infelizes.
Voz
Abraçada nas palavras
Embolada na agonia.
Visões embaraçadas
A dor na traversia.
Não há paragem afeita
Quando a linguagem muda
Muda insatisfeita.